Uma bike feminista na FLIP
Carl Gustav Jung defendia que casualidade não existe. Para classificar os acontecimentos que se relacionam sem que haja explicação lógica, formulou o conceito de sincronicidade – associada a uma relação por significado. Parece-me apropriado para o momento e explico porquê. Quando estávamos definindo como seria a participação da Primavera Editorial na Feira Literária Internacional de Paraty (FLIP), a inspiração veio de um livro que estávamos lançando: Wonder Women, de Sam Maggs, ilustrado por Sophia Foster-Dimino. A obra traz 25 perfis de mulheres inovadoras, inventoras e pioneiras que fizeram a diferença no mundo. Uma dessas vidas inspiradoras é a ciclista e jornalista norte-americana Annie Londonderry.
O livro mostra que Annie encontrou o caminho da emancipação, em 1890, graças a uma bicicleta. Na época, a bike se tornou símbolo internacional de uma “nova mulher”, que se opunha aos ideais Vitorianos; a “magrela” era classificada como um novo instrumento de poder. Quando uma mulher assumia o banco da bicicleta, a sensação de autoconfiança e independência a libertava das amarras sociais; a plena imagem de feminilidade não confinada; a mobilidade abria mil novas possibilidades. Há uma frase muito interessante de Susan B. Anthony – que entrevistou Annie Londonderry, em 1896, para o New York Times –, na qual diz que a bicicleta fez mais para emancipar as mulheres do que qualquer outra coisa no mundo. Aos 23 anos, em 1894, Annie iniciou uma jornada audaciosa: uma volta ao mundo de bicicleta, em 15 meses.
Eis que outra Anne entrou em ação na nossa equação inspiracional rumo à FLIP 2018. Estou acompanhando a série Anne with E, baseada no clássico da literatura infantojuvenil canadense Anne of Green Gables – de Lucy Maud Montgomery, publicado em 1908. Exibida pela Netflix, a bela série é ambientada na Ilha do Príncipe Eduardo, uma das 10 províncias do Canadá. Em pleno século XIX, uma sociedade conservadora é confrontada por uma garota imaginativa e questionadora. Na segunda temporada surge, de bicicleta e calças compridas, uma professora tão socialmente disruptiva quando Anne. Bingo! A sincronicidade nos trouxe a inspiração dupla para criar uma bike feminista, repleta de livros com visões diferentes de um tema essencial. A bike feminista da Primavera Editorial está estacionada no espaço das editoras e autores independentes, A Casa da Porta Amarela, na Rua da Cadeia. Estão todos convidados!
Ah, antes que alguns leitores afirmem que Jung foi machista, confesso que não resisti ao ímpeto de inseri-lo em um artigo profundamente feminino e feminista.
– Lu Magalhães, presidente da Primavera Editorial