A segunda vida de um livro
*Por Diogo Salles
Convidado a integrar este espaço, pensei sobre o que eu poderia escrever, uma vez que meu livro pela Primavera Editorial já completou um ano e meio de lançamento. Outro dia, conversando com a minha editora, ela falou em “dar uma segunda vida ao livro”. De fato existem algumas obras (livros, discos ou filmes) que envelhecem muito bem e resistem ao implacável teste do tempo. Já outras ficam pelo caminho, se convertendo em obras que se encaixam apenas no contexto e período em que foram lançadas.
No caso do meu ‘Trágico e Cômico: os protestos em charges’, lançado em maio de 2014, vivíamos a expectativa da Copa do Mundo no Brasil e das eleições – ambas prometiam ser acirradas. Seis meses depois o “imagina na copa” virou “7 a 1 foi pouco” e estávamos diante das eleições presidenciais mais imundas de nossa história recente.
Nesse ponto, acredito que o clima de guerra que o Brasil vivia durante a campanha pode ter prejudicado um pouco as vendas, pois uma das minhas principais propostas no livro era de refletir sobre os rumos do país e desconstruir essa polarização estúpida entre PT e PSDB (ou Lula/Dilma e FHC). Pelas redes sociais, percebi que ocorria o contrário. A polarização tinha virado guerra e as pessoas não queriam nem saber de debater, só de bater.
Hoje somos o país do ódio, dos extremismos e da desinformação. Em um momento como este, meu livro ganha outro significado, podendo recolocar algumas ideias em perspectiva. Por exemplo: como pode um cidadão sair às ruas levantando cartazes contra a corrupção se ele próprio não quer abrir mão dos seus “jeitinhos”? Para criticar a corrupção é preciso primeiro entender o que ela significa. Outro exemplo: será que “o Brasil acordou” mesmo em junho de 2013? Tenho bons motivos ― ou melhor, charges ― para acreditar que não.
Minha proposta de leitura é trazer temas densos e/ou filosóficos como esses numa linguagem gráfica que seja atrativa e bem humorada. Não há melhor maneira de explicar a política do que a charge. É nela que os políticos ficam nus diante do público, com todas suas mentiras e contradições expostas. Melhor ainda se a charge puder espelhar governantes e governados, trazendo a crítica social à tona. Acredito que o livro possui essas duas qualidades.
‘Trágico e Cômico’ é, acima de tudo, uma crítica ao Brasil e aos brasileiros. Se ele merece uma segunda vida, cabe a você, leitor, essa decisão.
Foto: Fernando Stankuns